23 de setembro de 2013

Eletrizante - Final



          A chuva mínguou, pelo menos não tínhamos mais que suportar aquele uníssono das gotas de chuva batendo sobre as folhas das árvores. Apesar da tremenda escuridão, pelo ruído da água nas pedras, podia imaginar que o córrego havia diminuído.

           No momento da tempestade, de chuva forte, de córrego cheio, a água me jogou no barranco, acima da metade, onde todo estropiado me segurei dos arbustos ali existentes, tremendo de frio, num misto de  medo e solidão.

            De repente vi uns fechos de luz nervosos na mata. Era uma parte da equipe procurando alguns homens que foram arrastados pela enxurrada.
 
         Aqui, socorro, comecei a gritar desesperadamente. Foi assim que o mateiro Toninho me achou. É o doutor, ele falou e chamou mais homens. Não foi preciso, porque ele esticou o braço do qual me segurei e, apesar do corpo que me doía, fui puxado para cima, até uma plataforma de areia fina e sem mato.

        -Aqui o senhor pode ficar até o dia clarear, falou o mateiro.

             Deixei meu  corpo cair na areia fina, parecia, porém, que havia apanhado de pau, tanto me doía o corpo, da cabeça aos pés.

         Quando deitei na areia percebi que o sangue da minha cabeça havia descido pelo rosto inchado e ficou lá até coagular. Em contato com a areia, uma grossa crosta secou no lado esquerdo do meu rosto. O olho estava tampado pelo inchaço e pelo sangue, a mesma coisa acontecendo com o lado esquerdo da boca.

           Mas o cansaço foi maior, demoraram apenas  alguns minutos e eu que já estava exausto, dormi profundamente.

          O canto dos passarinhos da Amazônia, antes do dia clarear, me acordou, foi um belo momento de reflexão, ao tempo em que trocava de posição, pois o meu braço esquerdo quedara por baixo do corpo, de tal maneira que  formigava, na verdade nem  o sentia.   
          Como é a vida tão desigual, já estávamos às portas do novo ano, e o homem já havia chegado à Lua, numa viagem que, certamente, ficará na história pela avançada tecnologia aplicada, enquanto nós, estávamos na Terra mesmo, na pior das situações que um ser humano pode ficar, sem comida, alguns feridos, longe de tudo e de todos. Que situação!

            O dia, finalmente, clareou, os pássaros se animaram e bandos de araras passaram bem alto.

            O corpo todo me doía, parecia que tinha sido passado por um gigantesco moedor de carne.

           Bem coragem, pelo menos estava vivo. Juntei todas as minhas forças e me sentei, só aí, olhando em torno, é que percebi que ali era um antigo cemitério de índios e seringueiros. Havia dormido por cima de uma tumba, por isso a areia fina do lugar.

           Não lembro mais o que atinei a fazer logo após a descoberta, só sei dizer que pouco a pouco escorreguei na tumba, deixando os pés pendurados na extremidade do túmulo. Foi quando um passarinho pousou do meu lado, cantou e cantou a exaustão. 

         Naquele instante, acabava mais uma historia que ficou gravada para sempre em minha memória. Duas lágrimas escorreram dos meus olhos e se perderam no calor da areia. Que sorte a minha!



HUGOALBERTO CUÉLLAR URIZAR
É Cineasta, Jornalista e escritor, é diretor técnico
da Produtora Sudameris em Osasco-SP
sudamerisosasco@hotmail.com
 

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