O CESNA 170 foi preparado na extremidade do campo de pouso de
Porto Velho, capital do então Território Federal da Rondônia. Na área do Rio
Rocego, a uma hora de voo, estavam esperando algumas dezenas de homens, e a nós
caberia a tarefa de levar mantimentos não perecíveis e a viagem também serviria
para levar na volta o Chefe da Pesquisa e mais um geólogo.
Vi quando carregaram no avião quatro sacos de pão torrado, pensei
que todos os mantimentos já estivessem à
bordo. Minha primeira tarefa seria, agora,
a de embarcar no avião e viajar sobre a
floresta amazônica por mais de uma hora. e a fim de quebrar a monotonia do voo dava até para tirar uma soneca durante a
viagem.
Quando me acomodei ao lado do piloto, qual não foi minha
surpresa ao ver que no compartimento de carga nada foi colocado, ao contrário,
tiraram os bancos para dar mais espaço ao burro que, anestesiado, e com as
quatro patas amarradas, dormia tranquilamente graças ao sonífero que injetaram nele.
Em condições normais, certamente jamais seria possível colocar o animal dentro
do avião.
Bem, como dizem o que não tem remédio, remediado está. O
velho Cesna 170, como se tomasse um fôlego, parou e logo acelerou na
extremidade do campo de pouso. Correu a
pista inteirinha e levantou voo acima das casas e avenidas de Porto Velho,
com a proa apontada para à selva, que em alguns segundos sobrevoaria.
Rio Madeira |
Pouco tempo depois, Porto Velho seria apenas mais um clarão
às margens do Rio Madeira. De vez em quando, víamos o reflexo do sol na água de algum
igarapé no meio da floresta. A selva é qualquer coisa de impressionante, é um
mundo verde a qualquer lado que se olhe da janela do avião, que embora fosse um
modelo antigo, com trem de pouso fixo nas duas rodas da frente e uma roda móvel
na cauda, voava a mais de duzentos quilômetros em linha de voo.
Finalmente, depois de ter deixado há quase duas horas Porto
Velho, à direita, bem longe, perdido no meio da imensa floresta, vimos um
pequeno clarão na vegetação, era o campo Belo Horizonte, onde deveríamos
pousar. À medida que o avião e sua carga viva, voava, o campo ia crescendo na
nossa visão, até pousar aos saltos na pista de pouso, pois o solo era bem
irregular. O avião parou a pouco mais de
seis metros das árvores da extremidade do campo, taxiou em direção à cabeceira,
onde podiam ser vistos alguns homens e um casarão abandonado há muito tempo
pelos seringueiros, e que servia para guardar a carga dos aviões, e para o
descanso da equipe de pesquisa.
Logo que o avião parou, apareceram mais braçais, e o Dr. Raph
Angel, um engenheiro Australiano, chefe da pesquisa, acompanhado do geólogo
paraguaio, Dr. Julian. Depois dos cumprimentos de praxe e um breve
descanso, o piloto e os dois técnicos se
acomodaram na aeronave, pois agora sobrava espaço, já que o burro fora
arrastado para fora do avião que depois de taxiar na extremidade do campo,
acelerou e correu levantando voo, para depois, em pouco tempo, desaparecer no
ar. Restou ali, apenas o ruído da água
correndo no leito do córrego Belo
Horizonte, e logo depois o barulho de um
bando de periquitos que pousaram na
imensa mangueira.
Tínhamos que nos
apressar, e, assim que o burro voltasse a si, seria carregado com gêneros
alimentícios e o pão que trouxemos conosco, pois teríamos mais uma hora de caminhada pelo varadouro até o
acampamento 1, igarapé acima.
E assim foi. Só que atravessamos o primeiro córrego, enfrente
à casa dos seringueiros, na pista, pelo leito do córrego, pois o tronco que
servia como ponte, havia criado tanto limo que era perigosamente escorregadio.
Andamos por mais de uma hora pelo varadouro sempre em fila
índia e beirando o córrego, só afastando-nos dele quando o varadouro fazia uma
curva para ficar fora de algum barranco muito alto.
Os 20 homens, um dos que puxava o burro pela brida, nos
seguiam por vezes calados, por vezes às gargalhadas. Alguns deles, como eles
próprios afirmaram, lá estavam por um tempo só, o suficiente para ganhar um dinheiro
e fugir aos problemas, ignoravam eles o ditado que diz que por mais longe que
se possa ir para fugir dos problemas, sempre os levaremos conosco.
No meio da tarde, numa curva, de repente, num monte de
palhas, ergueu-se à minha frente, a uns três metros de distância, uma cobra
Surucucú, uma das espécies mais venenosas.
A parte visível da cobra, erguida e reta, teria no máximo um
metro. A língua do réptil, partida em duas pontas na extremidade, saía e
entrava na boca do animal que nos olhava
fixo, pronto para o mortal bote.
Todos ficamos imóveis, mudos e quietos. Qualquer movimento,
por mínimo, seria fatal para nós, ainda mais naquele lugar, sem nenhum recurso
e no meio da mata.
De repente, ouvimos um estampido seco, e a cabeça da cobra se
despedaçar. Era o mateiro Toninho que tinha atirado na cabeça da perigosa
cobra. Ufa, tinha acabado o pesadelo. Depois do susto continuamos nossa
caminhada, que na verdade, pelo menos mais uns quarenta minutos de boa
caminhada nos esperava ainda.
Bom, não tínhamos outra alternativa, lá fomos nós....
HUGOALBERTO CUÉLLAR URIZAR
É Cineasta, Jornalista
e Escritor, é diretor técnico
da Produtora
Sudameris em Osasco-SP
sudamerisosasco@hotmail.com
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