5 de agosto de 2013

A VIAGEM SEM FIM

           
        O dia estava no ocaso.  A bordo dos dois rebocadores observava-se intenso movimento, carregavam  combustível e óleo para os motores e alimentos para a tripulação e convidados na viagem rumo à Capital Paraense.
      Enquanto cada um dos dois rebocadores colocava num alinhamento  só, duas enormes balsas, cheias de carretas com artigos da Zona Franca de Manaus,  -- que seriam, depois, engatadas por cavalinhos que estavam enfileirados esperando a chegada de nosso comboio no porto de Belém--, ouvia-se nas margens do  embarcadouro de Manaus, o coaxar das rãs e o zumbido  dos mosquitos.
   O dia acabava, porém era necessário abastecer suficientemente de combustível os motores dos  dois rebocadores, pois, só parariam de funcionar no destino final.
    Quando ouvimos o ronco dos motores sendo ligados, sabíamos que ali  iniciávamos longa viagem sobre as águas, rumo a Belém do Pará. Começamos  sobre as águas do Rio Negro, e logo, a 8 quilômetros adiante, acontecia  o encontro com as águas  do rio Solimões, desse ponto em diante, majestoso, nos esperava o belo Rio Amazonas.
           Em volume  d'água, certamente, o Rio Amazonas é o maior do planeta, e em comprimento, só é menor que o Rio Nilo, ao NE do Continente africano. Na bacia do Amazonas, tudo funciona em função do rio, e toda a população ribeirinha, as cidades, o transporte e a alimentação de homens e animais , tudo enfim, depende do rio.
     Depois que o manto negro da noite abaixou definitivamente sobre nossas cabeças, já estávamos navegando sobre as águas do Rio Amazonas, cujas margens recuaram para bem longe, e só adivinhávamos sua posição, graças à fraca luz de algumas das casas ali construídas.
        Nos preparamos para o jantar que foi feijão com macarrão e pedaços de frango.  Comemos avidamente, nem tanto pela fome, mas porque aquela hora nada mais havia para fazer. O resto de comida nos pratos, prontamente o cozinheiro raspou encima da água a bombordo,  local  que de imediato atraiu peixes de todos os tamanhos.
           Como todos os quartos do nosso rebocador já estavam lotados, me instalei no corredor, e depois deitei, pois nos esperava uma longa e barulhenta noite nas águas do Rio-Mar, como é conhecido o Rio Amazonas.
             Anestesiado pelo calor não sei quanto tempo dormi,  de repente um forte impacto me jogou à frente do corredor! Imediatamente o motor do rebocador parou. Nos instantes  seguintes, um silêncio terrível se apoderou  do comboio, apenas  cortado pelas vozes apressadas de alguns homens  que cuidavam das cargas das carretas.
              O rebocador da frente, ao passar por um banco de areia freiou de vez, e o de traz, onde nós viajávamos, bateu forte fazendo com que algumas das  carretas que estavam  sendo transportadas sobre 12 pneus na parte posterior, e duas travas tubulares na frente, escorregassem sobre a rede onde dormia um dos motoristas, que morreu esmagado na hora!
                 Já era de madrugada e não fazíamos ideia de qual seria  a jurisdição fluvial daquele lugar, se a do Estado do Amazonas ou do Pará, e,  quando o dia clarear, deveríamos permanecer  parados no local, sem mexer em nada, mormente na carreta que caiu e matou uma pessoa. De qualquer forma tínhamos que aguardar a chegada da polícia.
                 Quando, finalmente, os raios de luz iluminaram a floresta e as águas do rio, apareceu, como num passe de mágica, tanta gente ribeirinha, de todas as idades, vendendo  comidas.
              Como nada podíamos fazer, num barco rabo quente, levei muita gente de uma margem para outra. Confesso agora, muitos anos depois, que nunca antes tinha feito este trabalho.
             Numa dessas viagens, talvez a última do dia, voltava ao rebocador quando de repente, a água do rio levantou-se uma grande bolha em meio à que apareceu  um enorme peixe que voou para fora da água e, projetando-se num arco, voltou a mergulhar no rio. Todos os que vimos a cena ficamos mudos e estáticos, alguns passageiros, depois que se recuperaram do susto, arriscaram a dizer que era um filhote de baleia, o que não poderia ser, porque ainda estávamos viajando em água doce. Mas que deu um tremendo de um susto, na verdade deu. Só de uma bocanhada  este imenso peixe, certamente nos quebraria todos os ossos.
                  Abstraindo esse susto, só ouvimos o ronco do motor sendo ligado e o barulho da hélice afundando na água. Depois de vários dias, voltaríamos a viajar. Aleluia!
Aos poucos fomos chegando a Santarém, uma grande cidade ribeirinha amazonense,  que não estava em nosso roteiro, portanto,  nosso comboio passaria ao longo da cidade . E assim foi! Estávamos admirando de longe a cidade, quando reparamos que sobre as águas, bem adiante, apareceram várias canoas, cheias de jovens mulheres. No encontro com nosso comboio, elas jogaram uma corda para amarrar a sua canoa no nosso rebocador, que abaixou a rotação do motor.
                 Depois do deleite do amor à bordo, as mulheres que deram tanto prazer aos marinheiros, voltaram à sua canoa com as burras cheias.
No outro dia, surgiu Belém, e foi lá que acabou nossa inesquecível viagem!





HUGOALBERTO CUÉLLAR URIZAR

É Cineasta, Jornalista e Escritor, é diretor técnico
da Produtora Sudameris em Osasco-SP
sudamerisosasco@hotmail.com
  

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